Após publicação americana dizer que jovens são preguiçosos e
exibicionistas, tema foi assunto mais comentado nas redes sociais
Tão excitantes quanto ameaçadores. Foi desta forma
que a revista americana Time classificou, na edição desta semana, os jovens nascidos entre 1980 e 2000. Eles fazem parte da geração Millennials –
chamada de Eu Eu Eu (em inglês, Me
Me Me): muito conectados, preguiçosos e extremamente
narcisistas. Mas que também são gente boa, acreditam em Deus, sem se apegar a
religiões, e otimistas.
Todos estes adjetivos movimentaram as redes sociais, dividindo opiniões.
Viviane Mondrzak, presidente da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre, é
contrária ao hábito popular de atribuir quase todos os problemas dos jovens à
internet e às novas tecnologias. Para ela, este comportamento “eu futebol
clube” tem muito mais a ver com a estrutura familiar e com as bases formadas ao
longo da vida, de limite e de orientação, do que com a proximidade com a web.
– Nossa cultura ocidental tende a reforçar posições narcisistas, porque
valoriza a rapidez, aparências, autossuficiência. É a cultura do pode tudo, tu
vais conseguir tudo – diz Viviane.
Ao contrário do que dizem as fontes consultadas na publicação
americana, Viviane não considera que os jovens estejam mais preguiçosos. Ela
prefere falar em intolerância à frustração:
– Temos jovens despreparados para enfrentar as frustações do mundo real.
Paulo Berél Sukiennik, médico psiquiatra e psicanalista, lembra que
Freud cunhou o termo narcisismo para designar algo necessário, em certa dose,
para o desenvolvimento do ser humano. É preocupante, entretanto, quando se
torna patológico – ligado ao egocentrismo. O médico reforça que, neste sentido,
são os adultos o foco de preocupação.
– A sociedade adulta está vivendo momentos infantis. Você vê isto no
trânsito, nas relações de trabalho, onde há importância para o seu próprio
umbigo em detrimento de respeitar o outro. O adolescente está copiando este
modelo – diz o psiquiatra.
E é na arrogância que Sukiennik busca explicações:
– O adolescente que se acha, pensa que não precisa aprender com os mais
velhos ou ler porque ele sabe tudo.
Lucas Liedke, diretor de tendências da Box1824, empresa de pesquisa,
enxerga estes assuntos por outro prisma. Para ele, o poder da
“registrabilidade” dá a estes jovens novas dimensões, como maior consciência do
que colocam para o mundo.
As caras da nova geração
Quando se coloca uma lupa sobre as criaturas que compõem a nova geração,
as verdadeiras cores do “eu, eu, eu” – assim como as justificativas para seus
bons e maus comportamentos característicos – acabam aparecendo. Na página de
Facebook de Gabriela Guerra, 26 anos, por exemplo, se encontra fotos dela nos
mais diferentes ambientes sociais, mas também se percebe que ela está sempre
engajada em alguma causa para melhorar o universo ao seu redor, desde ajudar a
organizar um cinema na Praça da Matriz, até levar um grupo de amigos com
mantimentos e tintas para alimentar o corpo e a alma das crianças da Vila
Liberdade, na Capital. Ela acredita que há individualismo na sua geração, mas
também vê uma energia para mudar as realidades ao redor. Mudar e postar na rede
social o resultado, claro.
– Vejo muita gente mais individualista, que reclama de protesto, mas
acho que até essa segurança do momento do país e a internet fazem a causa do
coletivo mais evidente – diz.
Gabriela, que é cofundadora do projeto Porto Alegre Como Vamos, enxerga,
sim, o reforço da autoimagem, mas não acredita que isso reflita um grupo de
narcisistas.
Talvez seja por esse motivo que Carolina Lopes, 19 anos, tire tantas
fotos de si mesma para postar nas redes sociais. Mais fã do Instagram que do
Facebook – o que evidencia outra característica de sua geração, a obsessão por
imagens – ela registra lá e compartilha com 600 seguidores sua própria figura,
sempre impecável, em diversos momentos da vida. As selfies (do termo self
shots, em inglês) são sempre as mais curtidas.
– Se estou me achando bonitinha tiro uma foto, se não, não (risos). Mas
não fico prestando atenção em quem curte, publico e deixo – conta.
Receber 20, 30 ou 100 likes em uma postagem só não é mais emocionante
que ver a notificação na rede social que avisa quando eles chegam. Um sinal,
mesmo que silencioso, de que alguém está “te dando bola”.
Renata Fortes, estudante de administração, poderia estar lendo receita
de bolo no telefone que, mesmo assim, sua ansiedade seria claramente
perceptível. Enfileirando palavras em uma velocidade que só os seus 19 anos
poderiam permitir, conta que chega a dormir com o celular debaixo do
travesseiro e acorda quando ouve o barulho de uma nova mensagem para responder.
O frenesi já rendeu até crise de choro no supermercado por ficar sem bateria no
celular.
Outra característica dessa nova geração é a falta de paciência com os
mais velhos. Renata confessa que chegar a fazer os trabalhos de faculdade
sozinha quando fica em um grupo com algum colega muito mais velho:
– Geralmente faço a parte deles, senão fico muito nervosa e pensando
“ah, por que essa pessoa é tão lenta?”.
COMO A NOVA GERAÇÃO MUDA O MUNDO
— O estudo o sonho Brasileiro, da Box 1824, empresa de pesquisa
especializada no mapeamento de tendências de comportamento, em parceria com o
Instituto Datafolha, investigou jovens entre 18 e 24 anos e mostrou que 8%
deles são caracterizados como jovens-ponte. Seriam estes os que vão canalizar
todas as características para fazer algo que sempre foi dito como tarefa da
juventude: mudar o mundo.
— A média das pessoas se relaciona de forma mais intensa com três ou
quatro grupos: família, trabalho, estudo e mais algum. O jovem que está age
pelo coletivo transita por muito mais grupos. Mais do que isto: recolhe ideias
e pensamentos destes grupos, para evoluir seu próprio pensamento e suas ações.
— Seu papel mais importante é o de redistribuir estes pensamentos e
ideias, conectando redes e pessoas que nunca se falariam.
— Não aceitam os discursos que velam o preconceito.
— Dá nova dimensão ao trabalho. Além da felicidade e realização pessoal,
quer fazer diferença na sociedade por meio da sua profissão.
— A política partidária e institucionalizada não o representa. Vê muito
mais sentido em agir politicamente no seu dia a dia, seja no consumo ou em
atitudes mais proativas.
FONTE: ZERO HORA / FêCris Vasconcellos e Kamila Almeida
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